HAVIA SÉCULOS
Havia séculos
e eram florestas sobre florestas escritas.
O canto cantava: era o incêndio do vento
folheando a memória da terra
essa maranha de raízes aéreas que nasciam enterrando
mais fundo as árvores anteriores;
essa teia nocturna de troncos e lianas, de ramos e folhas,
nervuras que os versos enervam irrespiráveis;
esse mapa em relevo lavrado pela paciência da luz
que atrasando-se recorta
estas estranhas esculturas do tempo:
os poemas selvagens
o máximo excesso de uma rosa aquática e frágil
sempre a nascer desfiladeiros
e falésias, fendas, quebradas, ravinas
vulcões que deflagram em écrans sucessivos
Havia séculos
e o cinema dos astros
acendia ampolas e bagas, campânulas, cápsulas, lâmpadas;
punha em música a infinita noite dos versos que longamente
escutam
aqueles que muito antes ou muito depois vieram ou virão
até estes anfiteatros que os desertos invadem.
Havia séculos
e / atravessando as ruínas dessa terra quente, as páginas
de água dessa rosa alucinada / havia esse:
o comum de nós que dos seus se dividindo, verso
a verso, procura ainda alguém. E assim
era de novo o início.
A grande migração das imagens — havia séculos —
desde há muito começara, desde sempre, já.
E sem cessar migrávamos nós, inquietos e perdidos
sem paz e sem lei, sem amos nem destino.
(Migrações do Fogo, Editorial Caminho, Lisboa, 2004)
O nosso caminho não é de relva suave, é um trilho de montanha pejado de muitas pedras. Mas segue em frente, para cima, rumo ao Sol. E encontrarás a serenidade. Ruth Westheimer
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sábado, 30 de outubro de 2010
A TERCEIRA MÃO DE CARLOS DE OLIVEIRA
Manuel Gusmão
A TERCEIRA MÃO DE CARLOS DE OLIVEIRA
I
A primeira mão escreve com o tempo e contra
o tempo
a segunda reescreve o passado com o futuro e
por todo
o lado instaura o presente do fim
depois a terceira mão vem e escova
e constela os tempos
II
A primeira monta um cenário nocturno à espera
da noite que virá. A segunda traz a esse cenário
a noite glaciar. A terceira sobrepõe as noites
e revela o seu povoamento
comum: luz eléctrica, papel intensificado,
uma teoria da escrita, desolação.
III
Uma segreda e comove-se
no espelho tempestuoso. Outra seca
o saco lacrimal e deduz de si mesmo o movimento
que faz a emoção: A terceira contribui
com o espelho das metamorfoses, a câmara
que filma a dedução
[e enlouquece numa só letra.
[in A Terceira Mão, Caminho, 2008]
A TERCEIRA MÃO DE CARLOS DE OLIVEIRA
I
A primeira mão escreve com o tempo e contra
o tempo
a segunda reescreve o passado com o futuro e
por todo
o lado instaura o presente do fim
depois a terceira mão vem e escova
e constela os tempos
II
A primeira monta um cenário nocturno à espera
da noite que virá. A segunda traz a esse cenário
a noite glaciar. A terceira sobrepõe as noites
e revela o seu povoamento
comum: luz eléctrica, papel intensificado,
uma teoria da escrita, desolação.
III
Uma segreda e comove-se
no espelho tempestuoso. Outra seca
o saco lacrimal e deduz de si mesmo o movimento
que faz a emoção: A terceira contribui
com o espelho das metamorfoses, a câmara
que filma a dedução
[e enlouquece numa só letra.
[in A Terceira Mão, Caminho, 2008]
Manuel Gusmão
manuel gusmão - teatros do tempo
inverno
a fotografia olha devagar o fotógrafo e diz-lhe:
« de mim a ti o mundo é a chuva e o vento,
por trás de mim o mar é branco e as ondas longe
são o branco do branco.vejo nos teus olhos cegos
a estrada quasa submersa, os faróis de nevoeiro.
Mas nunca ouvi falar do verão.Deve haver algum engano.»
Leitura
http://angnovus.wordpress.com/2010/04/07/inquerito-sobre-a-coca-cola-manuel-gusmao/
Manuel Gusmão
Bibliografia
Ensaio e Antologia
A Poesia de Carlos de Oliveira (1981)
A Poesia de Alberto Caeiro (1986)
Poesia
Dois Sois, A Rosa - A Arquitectura do Mundo (1990/2001)
Mapas: o Assombro e a Sombra (1996)
Teatros do Tempo (1994-2000) (2001)
Os Dias Levantados (2002) (libreto para ópera de António Pinho Vargas)
Migrações do Fogo (2004)
Mapas o Assombro a Sombra (2005)
A Terceira Mão (2008)
via
http://poemas-poestas.blogspot.com/2008/05/manuel-gusmo_20.html
inverno
a fotografia olha devagar o fotógrafo e diz-lhe:
« de mim a ti o mundo é a chuva e o vento,
por trás de mim o mar é branco e as ondas longe
são o branco do branco.vejo nos teus olhos cegos
a estrada quasa submersa, os faróis de nevoeiro.
Mas nunca ouvi falar do verão.Deve haver algum engano.»
Leitura
http://angnovus.wordpress.com/2010/04/07/inquerito-sobre-a-coca-cola-manuel-gusmao/
Manuel Gusmão
Bibliografia
Ensaio e Antologia
A Poesia de Carlos de Oliveira (1981)
A Poesia de Alberto Caeiro (1986)
Poesia
Dois Sois, A Rosa - A Arquitectura do Mundo (1990/2001)
Mapas: o Assombro e a Sombra (1996)
Teatros do Tempo (1994-2000) (2001)
Os Dias Levantados (2002) (libreto para ópera de António Pinho Vargas)
Migrações do Fogo (2004)
Mapas o Assombro a Sombra (2005)
A Terceira Mão (2008)
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http://poemas-poestas.blogspot.com/2008/05/manuel-gusmo_20.html
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