terça-feira, 31 de agosto de 2010

We'll have the life I Knew we would

Como um pássaro que caiu




http://www.youtube.com/watch?v=rK0g_J1hhDc&feature=related

Leio

http://joaotordo.blogs.sapo.pt/95646.html

Antonioni

Amor e Medo

Fear/Love from Rob Chiu on Vimeo.




Three lives, three identities, three points of view. Set against the harsh backdrop of inner city London, Fear/Love interweaves the lives of three adolescents as they struggle with who they are, who they want to be and who they are becoming.

sábado, 28 de agosto de 2010

Limite para o amor

Maurice Frawley

Desculpa-me se não seguro estrelas

agarrando linhas
que não agarro
irreais
feitas de sombras
emaranhadas por ti não encontro a ponta por onde se pegue
e vejo luz por trás das linhas que enrolaste para mim
procuro pontas que não sei
hoje procurei-te por aqui
perdi-me no teu labirinto construido
desconstruo-o sem saber a razão
sem encontrar a ponta que me pode levar
não me desculpo de não te encontrar
todas as desculpas nada são
não desculpo as sombras que me dás
não desculpo essa luz de ilusão
agarrando linhas onde nada há
tento enrolar o que não existe
desculpa-me se não posso
desculpa-me se não sei tecer o impossível
nesse emaranhado de escuras linhas
belas
desenham uma estrela que não cai
nem te sustenta
definidas linhas num borrão de amores
não existem
reflexos esguios só do que imagino
desculpa-me se não te enrolo
desculpa-me se não seguro estrelas


Teresa Maria Queiroz/ Agosto 2010
via
http://continuandoassim.blogspot.com/

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O Brinde

The Freebie, which premiered at Sundance, hits theaters September 17. The film stars Dax Shepard and Katie Aselton. She directed the film about a couple's decision to have a one-night stand outside the marriage.

O brinde, que estreou no Sundance, chega aos cinemas 17 de setembro. O filme é realizado por Dax Shepard e Katie Aselton. Ela dirigiu o filme sobre a decisão de um casal ter uma noite, fora do casamento.




via
http://www.deadline.com/hollywood

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

SAUDADE



LETRA:

«A minha geração, já se calou, já se perdeu, já amuou,
já se cansou, desapareceu, ou então casou, ou então mudou
ou então morreu: já se acabou.

A minha geração de hedonistas e de ateus, de anti-clubistas,
de anarquistas, deprimidos e de artistas e de autistas
estatelou-se docemente contra o céu.

A minha geração ironizou o coração, alimentou a confusão
brincou às mil revoluções amando gestos e protestos e canções,
pelo seu estilo controverso.

A minha geração, só se comove com excessos, com hecatombes,
com acessos de bruta cólera, de morte, de miséria, de mentiras,
de reflexos da sua funda castração.

A minha geração é a herdeira do silêncio,
dos grandes paizinhos do céu,
da indecência, do abuso.
E um belo dia fez-se à vida,
na cegueira do comércio

A minha geração é toda a minha solidão, é flor da ausência, sonho vão,
aparição, presságio, fogo de artifício, toda vício, toda boca
e pouca coisa na mão.

Vai minha geração, ergue a cabeça e solta os teus filhos no esplendor do lixo e do descuido,
Deixa-te ir enquanto o sabor acre da desistência vai corroendo a doçura da sua infância.
Vai minha geração, reage, diz que não é nada assim,
Que é um lamentável engano, erro tipográfico, estatística imprecisa, puro preconceito,
Que o teu único defeito é ter demasiadas qualidades e tropeçar nelas.

Vai minha geração, explica bem alto a toda a gente
Que és por demais inteligente, para sujar as mãos neste velho processo, triste traste de Deus.
De fingir que o nosso destino é ser um bocadinho melhor do que antes.
Vai minha geração, nasceste cansada, mimada, doente, por tudo e por nada, com medo de ser inventada
O que é que te falta, agora que não te falta nada?
Poderá uma pobre canção contribuir para a tua regeneração ou só te resta morrer desintegrada?

Mas minha geração,
Valeu a trapaça, até teve graça, tanta conversa, tanta utopia tonta, tanto copo, e a comida estava óptima! O que vamos fazer?»


quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Valentina Igoshina



In all my life I have never again been able to find such a beautiful melody"
-Fredrick Chopin

Em toda a minha vida nunca mais foi capaz de encontrar uma melodia tão bela "
Chopin-Fredrick

O Peixe Mágico

THE MAGIC FISH from Mew Lab on Vimeo.



Baseado em um conto tradicional italiano, O peixe mágico é a história de um casal de idosos que vivem perto do mar e estão lutando para sobreviver. Um castanheiro antigo tem piedade deles e oferece-lhes ajuda, e o casal sendo os orgulhosos proprietários de um peixe, resolvem colocá-lo na parede da casa para atrair boas coisas e é ele, com o seu poder, que salva as suas vidas.

Amigos imaginários - adorável

Forget Me Not - Air Scheme Channel 4 from Mew Lab on Vimeo.



This story is told by Betty, an elderly woman, embroidering on a quiet afternoon.
When she was a child, during the Second World War, she had three invisible pets that she held with three strings. She knew they were invisible and the only way she could keep her imaginary friends close was to let never go of the strings.
She carried them all day and night, until one night during an air raid she was forced to leave them behind, losing them. She looked for them everywhere. Time passed and Betty grew old with the sensation that something was always missing, until one day she realised that she has never lost them, because her imaginary friends had always been living inside her.


Esta história é contada por Betty, uma mulher idosa, bordado em uma tarde tranquila.
Quando ela era criança, durante a Segunda Guerra Mundial, teve três animais invisíveis que ela segurava com três cordas. Ela sabia que eles eram invisíveis, ea única forma que ela pudesse manter seus amigos imaginários perto era deixar que nunca vai das cordas.
Ela levou-as durante todo o dia e noite, até que uma noite durante um raid aéreo foi forçada a abandoná-los, perdê-los. Ela olhou para eles em todos os lugares. O tempo passou e Betty envelheceu com a sensação de que algo estava sempre ausente, até que um dia ela percebeu que nunca perdeu a eles, porque seus amigos imaginários sempre esteve vivo dentro dela.

via
http://vimeo.com/4064836


Um pensamento de Khyentse Rinpoché

"If you encounter happiness, success, prosperity or other favorable conditions, consider them as dreams and illusions, and do not attached to them. If you are stricken by illness, calumny, deprivation, or other physical and mental trials, do not let yourself get discouraged, but rekindle your compassion..."



"Se você encontrar a felicidade, sucesso, prosperidade ou quaisquer outras condições favoráveis, deve considerá-los como sonhos e ilusões, e não a elas associadas. Se você estiver acometido de doença, a calúnia, a privação, ou outras física e mental ensaios, não se deixe desanimar, mas reacenda a sua compaixão ... "
Khyentse Rinpoché

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Oscar Wilde

"O Fantasma de Canterville, conto de Oscar Wilde, lê-se num fôlego.
A história é deliciosa. Uma família americana compra um castelo em Inglaterra. O castelo tem, há vários séculos, um fantasma que vai assombrando e fazendo a vida negra às várias gerações que o habitam. Desta vez, porém, a coisa correu mal. Modernas, pragmáticas, terrenas, filhas da ciência e da técnica, são as crianças americanas que perseguem o fantasma, o assustam, lhe pregam partidas, levando-o a fugir com medo. Há vários séculos que existe uma indelével mancha de sangue no chão da biblioteca. O sangue de Lady Eleanore de Canterville, assassinada em 1575 pelo marido e actual fantasma. Para as crianças americanas isso resolve-se facilmente com o Sabão Sem Rival Pinkerton, o sabão que apaga tudo.
Mas não é só a história que é deliciosa. O conto capta na perfeição a ruptura entre dois mundos, explicada por Max Weber com a ideia de "Desencantamento do Mundo". O choque que existe dentro daquele castelo entre um fantasma conservador e aristocrata que suscita medo, respeito, sentimento de distância e transcendência, e o burguês sentimento moderno segundo o qual a resolução de todos os problemas pode ser encontrada na ciência, na técnica, na economia, na produção. Isto, se houver problemas, pois uma das características da modernidade passa precisamente pela negação de velhos problemas, velhas perplexidades, velhas barreiras, velhas emoções e velhos sentidos. Para a modernidade, a forma mais eficaz de resolver o sentido de uma coisa é anular o seu próprio sentido.
Uma mancha de sangue há séculos no chão da velha biblioteca tem, naquele castelo, o mesmo sentido da cruz para um verdadeiro cristão de outrora. Uma coisa que não tem explicação mas que se aceita porque está lá e sem a qual a vida perde o sentido que se formou in illo tempore, o tempo sagrado, fonte de todos os sentidos.
O sabão Pinkerton tem explicação para tudo. O que faz uma mancha de sangue no chão de uma biblioteca senão manchar o chão de uma biblioteca tal como uma mancha de gordura mancha o chão de uma cozinha? A partir do momento em que se criou o sabão Pinkerton, o sabão Pinkerton apenas sabe apagar tudo o que mancha o chão, reduzindo o mundo a uma enorme cozinha. Limpa e asseada, como deverão ser todas as cozinhas. E tornando a humanidade numa espécie de criança americana dentro de um velho castelo inglês."

aqui
http://ponteirosparados.blogspot.com/

"desobediente"



In episode 3 of Boijmans TV, pupils of the Rotterdam Pole Dance Academy consider Ewoud van Rijn 'naughty', because in his imagination he regularly has a conversation with the Muses, the daughters of Venus. Security guard Arie has his reservations about the nude shackled women in Van Rijn's work, but at the same time is very interested in his background as cartoonist. When museum guide Bregje confronts the pole dancers with the famous painting Reproduction prohibited by the Belgian surrealist René Magritte, the ladies would really like to liberate the man in the portrait, who stands with his back to the viewer and is also seen from the back in the mirror. They want to know who he is and then he should see how beautiful the world really is. Ab, from the technical department, once again loses himself in the art. He is happy when he finds himself again.

No episódio 3 do Boijmans TV, os alunos do Pólo Rotterdam Dance Academy considerar Ewoud van Rijn "desobediente", pois em sua imaginação ele regularmente tem uma conversa com as musas, as filhas de Vênus. guarda de segurança Arie tem suas reservas sobre as mulheres nuas algemado na obra de Van Rijn, mas ao mesmo tempo está muito interessado em sua experiência como cartunista. Quando a guia do museu Bregje confronta os dançarinos do pólo, com a famosa pintura de Reprodução proibida pelo surrealista belga René Magritte, as senhoras que realmente gostaria de libertar o homem do retrato, que está de costas para o espectador e também é visto de costas na o espelho. Eles querem saber quem ele é e, em seguida, ele deve ver o quão belo o mundo realmente é. Ab, do departamento técnico, mais uma vez, perde-se no art. Ele fica feliz quando ele se encontra novamente.

http://www.youtube.com/watch?v=ZKQg_B6AUKk&feature=related

"Terrível"



Boijmans TV is a new programme about art and takes us on a journey in Museum Boijmans Van Beuningen in Rotterdam, the Netherlands. We not only meet an artist, but also museum visitors, the guards, a tour guide and the employee of the technical service is a perfect location for a television programme about the many faces of art. The museum has a world-class collection ranging from Old Masters to modern and contemporary art. But the museum does not draw a strict distinction between these periods. The relationship between historical and recent art has been cast in a new light since the installation in early 2007 of a work by the contemporary artist Maurizio Cattelan in a gallery among Old Master paintings. This installation plays an important role in Boijmans TV.

This second episode of Boijmans TV is called Mooi Lelijk ('Beautiful Terrible'). Museum guard Arie does not understand that artist Lily van der Stokker want to make art that she calls 'Terrible'. Her exhibition 'Terrible' was on view in Museum Boijmans Van Beuningen. Arie interviews Van der Stokker and wants to know if it is difficult or easy to compose an ugly drawing. In the meantime guide Bregje is host to a group muscled men of sport school Vreeland, who are very moved when they see the work I'm too sad to tell you of artist Bas Ader. At the security camera we spot museum worker Ab of the technical service who compares his muscles with the statue Pierre de Wissant van Auguste Rodin.

Boijmans TV is a cooperative project of Museum Boijmans Van Beuningen, RTV Rijnmond, Popov film and RO theatre and has been developed with support of the VSBfonds, partner in education of Museum Boijmans Van Beuningen, Mediafonds and Rotterdam Media Fonds. Directors: Sander Burger and Jetse Batelaan.


Boijmans TV é um novo programa sobre arte e nos leva a uma viagem no Museu Boijmans van Beuningen, em Roterdão, na Holanda. Nós não apenas encontrar um artista, mas também os visitantes do museu, os guardas, um guia turístico eo funcionário do serviço técnico, é um local perfeito para um programa de televisão sobre as muitas faces da arte. O museu tem uma coleção de classe mundial que variam de antigos mestres da arte moderna e contemporânea. Mas o museu não é uma distinção rigorosa entre esses períodos. A relação entre a arte histórica e recente foi lançado sob uma nova luz desde a instalação, no início de 2007, de um trabalho do artista contemporâneo Maurizio Cattelan em uma galeria entre pinturas do antigo mestre. Esta instalação tem um papel importante no Boijmans TV.

Este segundo episódio de Boijmans TV é chamado Mooi Lelijk ('Beautiful Terrível "). Museu guarda Arie não compreende que o artista Lily van der Stokker quer fazer arte, que ela chama de "terrível". Sua exposição 'Terrible estava em exibição no Museu Boijmans Van Beuningen. entrevistas Arie van der Stokker e quer saber se é difícil ou fácil compor um desenho feio. Entretanto guia Bregje é anfitrião de um grupo de homens musculosos de desporto escolar Vreeland, que são muito emocionado quando vê o trabalho que estou muito triste dizê-lo de artista Bas Ader. A câmera de segurança, spot museu Ab trabalhador do serviço técnico, que compara os músculos com a estátua de Pierre van Wissant Auguste Rodin.

Boijmans TV é um projeto cooperativo do Museu Boijmans Van Beuningen, RTV Rijnmond, Popov cinema e teatro RO e foi desenvolvido com o apoio do VSBfonds, parceira na educação do Museu Boijmans Van Beuningen, de Roterdão Mediafonds e Media Fonds. Administração: Burger Sander e Batelaan Jetse.

A noite de abertura, no Museu





More videos about art on: arttube.boijmans.nl

Museum Boijmans van Beuningen is producing its own television series together with RTV Rijnmond, Popov film and RO Theater . In Boijmans TV, the museum building provides a changing backdrop three main characters: a major work from the collection, a high profile artist exhibiting in Boijmans museum and a museum visitor who has the illusion of being in a different world.

The series is being broadcast weekly from 14 April 2010 by the regional television station RTV Rijnmond.
Boijmans TV has been developed with support from the VSBfund, partner in education to Museum Boijmans van Beuningen.



http://www.youtube.com/user/Museumboijmans

O espirro do panda bebé



The Giant Panda

"The Giant Pandas’ natural habitat is traditionally central and southwest China but Sneezing Baby Panda himself was actually born in the first captive breeding centre for pandas. A place called Wolong in China’s Sichuan province. Sneezing Baby Panda’s mother was Mao Mao and his Dad, well we’re not quite sure!
Wolong Giant Panda Breeding Centre is high in the mountains, part of a vast wild nature reserve of 200,000 hectares. However in May 2008 a massive earthquake wiped out much of the Centre along with villages and towns in the area. Most of the pandas including Sneezing Baby Panda were rescued and rushed down the hill to safety. But Sneezing Baby Panda’s mum, Mao Mao was crushed in her enclosure when a wall of rock and mud slid down into the valley. Everyone at the centre was devastated by the loss of the popular little panda but, she is, of course, immortalised in the Sneezing Baby Panda video clip!
The giant panda is one of the world’s rarest animals – it’s thought there are probably fewer than 2000 left in the wild. But they’re solitary critters - they don’t really like each other much, much less humans! So we’ll probably never have a real indication of numbers.
"

http://www.sneezingbabypanda.com/index.php



http://www.sneezingbabypanda.com/

5 PARA O MEIO-DIA - Humor Antena 3 - Multimédia RTP

5 PARA O MEIO-DIA - Humor Antena 3 - Multimédia RTP

Elli Choi



Elli Choi is now 6-year-old and played Mendelssohn Violin Concerto Movement 3 using a 1/4-size violin on the Strings International Summer Music Festival in Pennsylvania, USA. ... Piano (Mr. Davyd Booth).

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

DICIONÁRIO ON-LINE PORTUGUÊS

http://www.dicio.com.br/

Mas há a vida

Mas há a Vida

que é para ser
intensamente vivida,
há o amor.
Que tem que ser vivido
até a última gota.
Sem nenhum medo.
Não mata.

O ovo e a galinha por Clarice Lispector

O ovo e a galinha
por Clarice Lispector





De manhã na cozinha sobre a mesa vejo o ovo.

Olho o ovo com um só olhar. Imediatamente percebo que não se pode estar vendo um ovo. Ver o ovo nunca se mantêm no presente: mal vejo um ovo e já se torna ter visto o ovo há três milênios. – No próprio instante de se ver o ovo ele é a lembrança de um ovo. – Só vê o ovo quem já o tiver visto. – Ao ver o ovo é tarde demais: ovo visto, ovo perdido. – Ver o ovo é a promessa de um dia chegar a ver o ovo. – Olhar curto e indivisível; se é que há pensamento; não há; há o ovo. – Olhar é o necessário instrumento que, depois de usado, jogarei fora. Ficarei com o ovo. – O ovo não tem um si-mesmo. Individualmente ele não existe.

Ver o ovo é impossível: o ovo é supervisível como há sons supersônicos. Ninguém é capaz de ver o ovo. O cão vê o ovo? Só as máquinas vêem o ovo. O guindaste vê o ovo. – Quando eu era antiga um ovo pousou no meu ombro. – O amor pelo ovo também não se sente. O amor pelo ovo é supersensível. A gente não sabe que ama o ovo. – Quando eu era antiga fui depositária do ovo e caminhei de leve para não entornar o silêncio do ovo. Quando morri, tiraram de mim o ovo com cuidado. Ainda estava vivo. – Só quem visse o mundo veria o ovo. Como o mundo o ovo é óbvio.

O ovo não existe mais. Como a luz de uma estrela já morta, o ovo propriamente dito não existe mais. – Você é perfeito, ovo. Você é branco. – A você dedico o começo. A você dedico a primeira vez.

Ao ovo dedico a nação chinesa.

O ovo é uma coisa suspensa. Nunca pousou. Quando pousa, não foi ele quem pousou. Foi uma coisa que ficou embaixo do ovo. – Olho o ovo na cozinha com atenção superficial para não quebrá-lo. Tomo o maior cuidado de não entendê-lo. Sendo impossível entendê-lo, sei que se eu o entender é porque estou errando. Entender é a prova do erro. Entendê-lo não é o modo de vê-lo. – Jamais pensar no ovo é um modo de tê-lo visto. – Será que sei do ovo? É quase certo que sei. Assim: existo, logo sei. – O que eu não sei do ovo é o que realmente importa. O que eu não sei do ovo me dá o ovo propriamente dito. – A Lua é habitada por ovos.

O ovo é uma exteriorização. Ter uma casca é dar-se.- O ovo desnuda a cozinha. Faz da mesa um plano inclinado. O ovo expõe. – Quem se aprofunda num ovo, quem vê mais do que a superfície do ovo, está querendo outra coisa: está com fome.

O ovo é a alma da galinha. A galinha desajeitada. O ovo certo. A galinha assustada. O ovo certo. Como um projétil parado. Pois ovo é ovo no espaço. Ovo sobre azul. – Eu te amo, ovo. Eu te amo como uma coisa nem sequer sabe que ama outra coisa. – Não toco nele. A aura de meus dedos é que vê o ovo. Não toco nele – Mas dedicar-me à visão do ovo seria morrer para a vida mundana, e eu preciso da gema e da clara. – O ovo me vê. O ovo me idealiza? O ovo me medita? Não, o ovo apenas me vê. É isento da compreensão que fere. – O ovo nunca lutou. Ele é um dom. – O ovo é invisível a olho nu. De ovo a ovo chega-se a Deus, que é invisível a olho nu. – O ovo terá sido talvez um triângulo que tanto rolou no espaço que foi se ovalando. – O ovo é basicamente um jarro? Terá sido o primeiro jarro moldado pelos etruscos ? Não. O ovo é originário da Macedônia. Lá foi calculado, fruto da mais penosa espontaneidade. Nas areias da Macedônia um homem com uma vara na mão desenhou-o. E depois apagou-o com o pé nu.

O ovo é coisa que precisa tomar cuidado. Por isso a galinha é o disfarce do ovo. Para que o ovo atravesse os tempos a galinha existe. Mãe é para isso. – O ovo vive foragido por estar sempre adiantado demais para a sua época. – O ovo por enquanto será sempre revolucionário. – Ele vive dentro da galinha para que não o chamem de branco. O ovo é branco mesmo. Mas não pode ser chamado de branco. Não porque isso faça mal a ele, mas as pessoas que chamam ovo de branco, essas pessoas morrem para a vida. Chamar de branco aquilo que é branco pode destruir a humanidade. Uma vez um homem foi acusado de ser o que ele era, e foi chamado de Aquele Homem. Não tinham mentido: Ele era. Mas até hoje ainda não nos recuperamos, uns após outros. A lei geral para continuarmos vivos: pode-se dizer “um rosto bonito”, mas quem disser “O rosto”, morre; por ter esgotado o assunto.

Com o tempo, o ovo se tornou um ovo de galinha. Não o é. Mas, adotado, usa-lhe o sobrenome. – Deve-se dizer “o ovo da galinha”. Se eu disser apenas “o ovo”, esgota-se o assunto, e o mundo fica nu. – Em relação ao ovo, o perigo é que se descubra o que se poderia chamar de beleza, isto é, sua veracidade. A veracidade do ovo não é verossímil. Se descobrirem, podem querer obrigá-lo a se tornar retangular. O perigo não é para o ovo, ele não se tornaria retangular. (Nossa garantia é que ele não pode: não poder é a grande força do ovo: sua grandiosidade vem da grandeza de não poder, que se irradia como um não querer.) Mas quem lutasse por torná-lo retangular estaria perdendo a própria vida. O ovo nos expõe, portanto, em perigo. Nossa vantagem é que o ovo é invisível. E quanto aos iniciados, os iniciados disfarçam o ovo.

Quanto ao corpo da galinha, o corpo da galinha é a maior prova de que o ovo não existe. Basta olhar para a galinha para se tornar óbvio que o ovo é impossível de existir.

E a galinha? O ovo é o grande sacrifício da galinha. O ovo é a cruz que a galinha carrega na vida. O ovo é o sonho inatingível da galinha. A galinha ama o ovo. Ela não sabe que existe o ovo. Se soubesse que tem em si mesma o ovo, perderia o estado de galinha. Ser galinha é a sobrevivência da galinha. Sobreviver é a salvação. Pois parece que viver não existe. Viver leva a morte. Então o que a galinha faz é estar permanentemente sobrevivendo. Sobreviver chama-se manter luta contra a vida que é mortal. Ser galinha é isso. A galinha tem o ar constrangido.

É necessário que a galinha não saiba que tem um ovo. Senão ela se salvaria como galinha, o que também não é garantido, mas perderia o ovo. Então ela não sabe. Para que o ovo use a galinha é que a galinha existe. Ela era só para se cumprir, mas gostou. O desarvoramento da galinha vem disso: gostar não fazia parte de nascer. Gostar de estar vivo dói. – Quanto a quem veio antes, foi o ovo que achou a galinha. A galinha não foi sequer chamada. A galinha é diretamente uma escolhida. – A galinha vive como em sonho. Não tem senso de realidade. Todo o susto da galinha é porque estão sempre interrompendo o seu devaneio. A galinha é um grande sono. – A galinha sofre de um mal desconhecido. O mal desconhecido é o ovo. – Ela não sabe se explicar: “ sei que o erro está em mim mesma”, ela chama de erro a vida, “não sei mais o que sinto”, etc.

“Etc., etc., etc.,” é o que cacareja o dia inteiro a galinha. A galinha tem muita vida interior. Para falar a verdade a galinha só tem mesmo é vida interior. A nossa visão de sua vida interior é o que chamamos de “galinha”. A vida interior na galinha consiste em agir como se entendesse. Qualquer ameaça e ela grita em escândalo feito uma doida. Tudo isso para que o ovo não se quebre dentro dela. Ovo que se quebra dentro de galinha é como sangue.

A galinha olha o horizonte. Como se da linha do horizonte é que viesse vindo um ovo. Fora de ser um meio de transporte para o ovo, a galinha é tonta, desocupada e míope. Como poderia a galinha se entender se ela é a contradição de um ovo? O ovo ainda é o mesmo que se originou na Macedônia. A galinha é sempre tragédia mais moderna. Está sempre inutilmente a par. E continua sendo redesenhada. Ainda não se achou a forma mais adequada para uma galinha. Enquanto meu vizinho atende ao telefone ele redesenha com lápis distraído a galinha. Mas para a galinha não há jeito: está na sua condição não servir a si própria. Sendo, porém, o seu destino mais importante que ela, e sendo o seu destino o ovo, a sua vida pessoal não nos interessa.

Dentro de si a galinha não reconhece o ovo, mas fora de si também não o reconhece. Quando a galinha vê o ovo pensa que está lidando com uma coisa impossível. É com o coração batendo, com o coração batendo tanto, ela não o reconhece.

De repente olho o ovo na cozinha e vejo nele a comida. Não o reconheço, e meu coração bate. A metamorfose está se fazendo em mim: começo a não poder mais enxergar o ovo. Fora de cada ovo particular, fora de cada ovo que se come, o ovo não existe. Já não consigo mais crer num ovo. Estou cada vez mais sem força de acreditar, estou morrendo, adeus, olhei demais um ovo e ele me foi adormecendo.

A galinha não queria sacrificar a sua vida. A que optou por querer ser “feliz”. A que não percebia que, se passasse a vida desenhando dentro de si como numa iluminura o ovo, ela estaria servindo. A que não sabia perder-se a si mesma. A que pensou que tinha penas de galinha para se cobrir por possuir pele preciosa, sem entender que as penas eram exclusivamente para suavizar, a travessia ao carregar o ovo, porque o sofrimento intenso poderia prejudicar o ovo. A que pensou que o prazer lhe era um dom, sem perceber que era para que ela se distraísse totalmente enquanto o ovo se faria. A que não sabia que “eu” é apenas uma das palavras que se desenham enquanto se atende ao telefone, mera tentativa de buscar forma mais adequada. A que pensou que “eu” significa ter um si-mesmo. As galinhas prejudiciais ao ovo são aquelas que são um “eu” sem trégua. Nelas o “eu” é tão constante que elas já não podem mais pronunciar a palavra “ovo”. Mas, quem sabe, era disso mesmo que o ovo precisava. Pois se elas não estivessem tão distraídas, se prestassem atenção à grande vida que se faz dentro delas, atrapalhariam o ovo.

Comecei a falar da galinha e há muito já não estou falando mais da galinha. Mas ainda estou falando do ovo.

E eis que não entendo o ovo. Só entendo o ovo quebrado: quebro-o na frigideira. É deste modo indireto que me ofereço à existência do ovo: meu sacrifício é reduzir-me à minha própria vida pessoal. Fiz do meu prazer e da minha dor o meu destino disfarçado. E ter apenas a própria vida é, para quem viu o ovo, um sacrifício. Como aqueles que, no convento, varrem o chão e lavam a roupa, servindo sem a glória de função maior, meu trabalho é o de viver os meus prazeres e as minhas dores. É necessário que eu tenha a modéstia de viver.

Pego mais um ovo na cozinha, quebro-lhe a casca e forma. E a partir deste instante exato nunca existiu um ovo. É absolutamente indispensável que eu seja uma ocupada e uma distraída. Sou indispensavelmente um dos que renegam. Faço parte da maçonaria dos que viram uma vez o ovo e o renegam como forma de protegê-lo. Somos os que se abstêm de destruir, e nisso se consomem. Nós, agentes disfarçados e distribuídos pelas funções menos reveladoras, nós às vezes nos reconhecemos. A um certo modo de olhar, há um jeito de dar a mão, nós nos reconhecemos e a isto chamamos de amor. E então, não é necessário o disfarce: embora não se fale, também não se mente, embora não se diga a verdade, também não é necessário dissimular. Amor é quando é concedido participar um pouco mais. Poucos querem o amor, porque o amor é a grande desilusão de tudo o mais. E poucos suportam perder todas as outras ilusões. Há os que voluntariam para o amor, pensando que o amor enriquecerá a vida pessoal. É o contrário: amor é finalmente a pobreza. Amor é não ter. Inclusive amor é a desilusão do que se pensava que era amor. E não é prêmio, por isso não envaidece, amor não é prêmio, é uma condição concedida exclusivamente para aqueles que, sem ele, corromperiam o ovo com a dor pessoal. Isso não faz do amor uma exceção honrosa; ele é exatamente concedido aos maus agentes, àqueles que atrapalhariam tudo se não lhes fosse permitido adivinhar vagamente.

A todos os agentes são dadas muitas vantagens para que o ovo se faça. Não é o caso de se ter inveja pois, inclusive algumas das condições, piores do que as dos outros, são apenas as condições ideais para o ovo. Quanto ao prazer dos agentes, eles também o recebem sem orgulho. Austeramente vivem todos os prazeres: inclusive é o nosso sacrifício para que o ovo se faça. Já nos foi imposta, inclusive uma natureza adequada a muito prazer. O que facilita. Pelo menos torna menos penoso o prazer.

Há casos de agentes que se suicidam: acham insuficientes as pouquíssimas instruções recebidas e se sentem sem apoio. Houve o caso do agente que revelou publicamente ser agente porque lhe foi intolerável não ser compreendido, e ele não suportava mais não ter o respeito alheio: morreu atropelado quando saía de um restaurante. Houve um outro que nem precisou ser eliminado: ele próprio se consumiu lentamente na sua revolta, sua revolta veio quando ele descobriu que as duas ou três instruções recebidas não incluíam nenhuma explicação. Houve outro também eliminado, porque achava que “a verdade deve ser corajosamente dita”, e começou em primeiro lugar a procurá-la; dele se disse que morreu em nome da verdade com sua inocência; sua aparente coragem era tolice, e era ingênuo o seu desejo de lealdade, ele compreendera que ser leal não é coisa limpa, ser leal é ser desleal para com todo o resto. Esses casos extremos de morte não são por crueldade. É que há um trabalho, digamos cósmico, a ser feito, e os casos individuais infelizmente não podem ser levados em consideração. Para os que sucumbem e se tornam individuais é que existem as instituições, a caridade, a compreensão que não discrimina motivos, a nossa vida humana enfim.

Os ovos estalam na frigideira, e mergulhada no sonho preparo o café da manhã. Sem nenhum senso da realidade, grito pelas crianças que brotam de várias camas, arrastam cadeiras e comem, e o trabalho do dia amanhecido começa, gritado e rido e comido, clara e gema, alegria entre brigas, dia que é o nosso sal e nós somos o sal do dia, viver é extremamente tolerável, viver ocupa e distrai, viver faz rir.

E me faz sorrir no meu mistério. O meu mistério é que eu ser apenas um meio, e não um fim, tem-me dado a mais maliciosa das liberdades: não sou boba e aproveito. Inclusive, faço um mal aos outros que, francamente. O falso emprego que me deram para disfarçar a minha verdadeira função, pois aproveito o falso emprego e dele faço o meu verdadeiro; inclusive o dinheiro que me dão como diária para facilitar a minha vida de modo a que o ovo se faça, pois esse dinheiro eu tenho usado para outros fins, desvio de verba, ultimamente comprei ações na Brahma e estou rica. A isso tudo ainda chamo de ter a necessária modéstia de viver. E também o tempo que me deram, e que nos dão apenas para que no ócio honrado o ovo se faça, pois tenho usado esse tempo para prazeres ilícitos e dores ilícitas, inteiramente esquecida do ovo. Esta é a minha simplicidade.

Ou é isso mesmo que eles querem que me aconteça, exatamente para que o ovo se cumpra? É liberdade ou estou sendo mandada? Pois venho notando que tudo que é erro meu tem sido aproveitado. Minha revolta é que para eles eu não sou nada, eu sou apenas preciosa: eles cuidam de mim segundo por segundo, com a mais absoluta falta de amor; sou apenas preciosa. Com o dinheiro que me dão, ando ultimamente bebendo. Abuso de confiança? Mas é que ninguém sabe como se sente por dentro aquele cujo emprego consiste em fingir que está traindo, e que termina acreditando na própria traição. Cujo emprego consiste em diariamente esquecer. Aquele de quem é exigida a aparente desonra. Nem meu espelho reflete mais um rosto que seja meu. Ou sou um agente, ou é a traição mesmo.

Mas durmo o sono dos justos por saber que minha vida fútil não atrapalha a marcha do grande tempo. Pelo contrário: parece que é exigido de mim que eu seja extremamente fútil, é exigido de mim inclusive que eu durma como justo. Eles me querem preocupada e distraída, e não lhes importa como. Pois, com minha atenção errada e minha tolice grave, eu poderia atrapalhar o que se está fazendo através de mim. É que eu própria, eu propriamente dita, só tenho mesmo servido para atrapalhar. O que me revela que talvez eu seja um agente é a idéia de que meu destino me ultrapassa: pelo menos isso eles tiveram mesmo que me deixar adivinhar, eu era daqueles que fariam mal o trabalho se ao menos não adivinhassem um pouco; fizeram-me esquecer o que me deixaram adivinhar, mas vagamente ficou-me a noção de que meu destino me ultrapassa, e de que sou instrumento do trabalho deles. Mas de qualquer modo era só instrumento que eu poderia ser, pois o trabalho não poderia ser mesmo meu. Já experimentei me estabelecer por conta própria e não deu certo; ficou-me até hoje essa mão trêmula. Tivesse eu insistido um pouco mais e teria perdido para sempre a saúde. Desde então, desde essa malograda experiência, procuro raciocinar desse modo: que já me foi dado muito, que eles já me concederam tudo o que pode ser concedido; e que os outros agentes, muito superiores a mim, também trabalharam apenas para o que não sabiam. E com as mesmas pouquíssimas instruções. Já me foi dado muito; isto, por exemplo: uma vez ou outra, com o coração batendo pelo privilégio, eu pelo menos sei que não estou reconhecendo! Com o coração batendo de emoção, eu pelo menos não compreendo! Com o coração batendo de confiança, eu pelo menos não sei.

Mas e o ovo? Este é um dos subterfúgios deles: enquanto eu falava sobre o ovo, eu tinha esquecido do ovo. “Falai, falai”, instruíram-me eles. E o ovo fica inteiramente protegido por tantas palavras. Falai muito, é uma das instruções, estou tão cansada.

Por devoção ao ovo, eu o esqueci. Meu necessário esquecimento. Meu interesseiro esquecimento. Pois o ovo é um esquivo. Diante de minha adoração possessiva ele poderia retrair-se e nunca mais voltar. Mas se ele for esquecido. Se eu fizer o sacrifício de esquecê-lo. Se o ovo for impossível. Então – livre, delicado, sem mensagem alguma para mim – talvez uma vez ainda ele se locomova do espaço até esta janela que desde sempre deixei aberta. E de madrugada baixe no nosso edifício. Sereno até a cozinha. Iluminando-a de minha palidez.




LISPECTOR, Clarice. "O ovo e a galinha". In: Felicidade Clandestina: José Olympio, 1975.
via
http://niilismo.net/

conto "O ovo e a Galinha" de Clarice Lispector

O conto "O ovo e a Galinha" se parece mais com uma dissertação sobre o mistério do ovo. Mas sendo algo entre a crônica e o conto ou um simples texto sem classificação, pouco tem daquela organização que encontramos no poema "O Ovo da Galinha", de João Cabral de Melo Neto.

"O ovo e a galinha" começa com uma frase em que se identifica o tempo, o espaço e o narrador da história: "De manhã na cozinha sobre a mesa vejo um ovo".

Em seguida todos esses referenciais começam a ser desmantelados: "Imediatamente percebo que não se pode estar vendo um ovo. Ver um ovo nunca se mantém no presente: mal vejo um ovo e já se torna ter visto um ovo há três milênios?"

O assunto inicial, o ovo, vai desdobrando-se e multiplicando-se com o desenrolar do texto. Definido como "tratado poético sobre o olhar", pelo crítico José Miguel Wisnik, ou como "meditação", por Benedito Nunes, "O ovo e a galinha" é um texto que alarga os limites da obra literária e, embora apresente os elementos básicos de uma narrativa, faz pensar sobre o que é preciso exatamente para contar uma história, coisa que de fato não ocorre em seu caso.

O ovo, tema do conto, parece também um subterfúgio. Às vezes parece ser a representação da vida, outras da liberdade, ou a verdade, ou a opressão, ou algo para desviar a atenção da essência, ou a própria essência. Após muitas considerações, algumas lógicas outras alucinantes e subjetivas, sobre o ovo, a narradora passa a dizer de um “eles” indeterminado, que manipula, que permite, que sugere, que instrui, que obriga, mas que não consegue eliminar totalmente a vontade e a consciência.

A palavra, no conto, funciona como disfarce da realidade. Muitas e controvertidas palavras geram contradições que escondem a verdade.

Este texto reforça uma das características nas obras de Clarice Lispector que é a analise introspectiva, ou seja, é uma narrativa baseada na memória, na emoção, isto é, no fluxo da consciência do narrador. Como já citado, esta narrativa rompe com a linearidade, não fica clara a estrutura de início, meio, fim.

Com a frase inicial da narrativa, “de manhã, na cozinha, sobre a mesa vejo um ovo”, Clarice faz uma relação com o início do dia e o início da vida. O ovo representa o narrador, o presente, o passado e o futuro. Isto é o tempo percorrido, isto é o ciclo da vida.

“Olhar curto e indivisível; se é que há pensamento; não há; há o ovo”. Nesta análise o narrador compara o ovo com o infinito, sem começo, nem fim.

No próximo parágrafo veremos que Clarice diz que ver o ovo é impossível, somente a máquina vê o ovo. O cão não vê o ovo. O amor pelo ovo também não se sente. Mas é super sensível. A gente não sabe que ama o ovo, mas já fui depositária do ovo; quando morri tiraram o ovo de mim e só quem visse o mundo veria o ovo. Como o mundo o ovo é obvio. No próximo parágrafo Clarice fala em entendimento.

Diz: "ao ovo dedico a nação chinesa (fazendo uma referência à superpopulação)". Depois diz que "o ovo é uma coisa suspensa (como o mundo); olho o ovo para não quebrá-lo. Tomo cuidado de não entendê-lo. Entendê-lo não é modo de vê-lo. O que não sei do ovo é que é realmente imortal. A lua é habitada por ovos. O que é ovo? É uma exteriorização. É dar-se; quem vê mais do que a superfície esta com fome. O ovo é a alma da galinha. Ovo um projétil parado. Ovo é ovo no espaço. O ovo me vê. Eu te amo. Ovo. A aura dos meus dedos é que vê o ovo. Mas dedicar-me à visão do ovo seria morrer para a vida mundana. Eu preciso da clara e da gema (referência feita ao senhor Deus - “clara a gema” referência feita à ciência e a religião). O ovo é um dom. O ovo é invisível a olho nu. O ovo terá sido talvez um triângulo que tanto rolou no espaço que foi se ovulando (triângulo = trindade, ovulando = eterno, infinito). O ovo é originário na Macedônia (Jesus Cristo andou pela Macedônia), o homem o desenhou na areia e depois o apagou com pé nu.

Clarice continua dizendo que o ovo é coisa de se tomar cuidado. O ovo vive sempre foragido. Por estar sempre adiantado demais para a sua época. O ovo é branco, mas não pode se chamado Dr. Branco. Uma vez um homem foi acusado de ser o que ele era. E foi chamado de “aquele homem” (referência feita a Jesus).

O ovo ganha um sobrenome: ovo de galinha. Nesse parágrafo Clarice nos apresenta o perigo que o ovo representa.

"Perigo que ele se descubra, se descobrirem poderiam obrigá-lo a se tornar retangular. Mas não pode. Sua grandiosidade vem da grandeza de não poder, que se erradia como um não querer. O ovo nos põem em perigo. Nossa vantagem é que ele é invisível.
O ovo é o grande sacrifício da galinha. O ovo é a cruz da galinha. O ovo é a cruz que a Galinha carrega na vida. O ovo é o sonho inatingível da Galinha. A galinha ama ovo (galinha = humanidade = ovo = Deus). Ela não sabe que existe o ovo se soubesse que existia em si mesma ela se salvaria (humanidade e Deus)? O desarvoramento da galinha vem disso; gostar não fazia parte de nascer. Gostar de estar vivo dói. Quanto veio antes. Foi o ovo que achou a galinha, a galinha não foi sequer chamada. A galinha é diretamente escolhida. A galinha vive como um sonho. Não tem senso de realidade. O mal desconhecido da galinha é o ovo. A galinha tem muita vida interior. A galinha olha o horizonte. Como se da linha do horizonte viesse vindo um ovo. Como a galinha poderia se entender se ela é o oposto do ovo. A contradição do ovo?
Dentro de si a galinha não reconhece o ovo. Fora de si também não. De repente olho o ovo na cozinha e penso em comida. Está se fazendo a metamorfose em mim. Fora do ovo que se come, o ovo não existe."

Neste parágrafo Clarice volta a falar da galinha: sua felicidade, suas perdas e seus ganhos. Suas penas para amenizar, suavizar a travessia ao carregar o ovo. Seu prazer. Mas continua não entendendo o ovo. E Clarice muda o discurso. Deixa de falar do ovo e da galinha para começar a falar de agentes.

Nos agentes disfarçados e distribuídos pelas funções menos reveladoras, mas às vezes nos reconhecemos e a isso chamamos amor. Então não é necessário o disfarce: embora não se fale. Também não se mente, embora não se diga a verdade, também não e necessário dissimular. E o texto continua, nesse parágrafo falando do amor, da vaidade, desilusão. Do amor que enriquece, faz referência à inveja, ao prazer como uma doação recebida sem orgulho.

O parágrafo termina dizendo que nos foi imposta uma natureza toda adequada ao prazer que facilita, torna menos penoso o prazer.

No parágrafo que segue o texto fala dos agentes que se frustrados se suicidam, de outros que deixam de viver por motivos diversos. Até o fim o parágrafo faz menção à existência, à vida em si. Traz o problema da galinha para a existência humana que o texto chama de agentes. Fala em morte, ingenuidade, tolice, lealdade, são agentes presentes na natureza humana, que o agente não vê, não conhece assim como a galinha não vê, e não conhece o ovo, mas que carrega dentro dela com dificuldades. O parágrafo se completa da seguinte forma. Para os que sucumbem e se tornam individuais é que existem as instituições, a caridade, a compreensão que não discrimina motivos a nossa vida enfim.

Nos últimos parágrafos o narrador volta à realidade. Como começou a narrativa ele a termina. O ovo que estava sobre a mesa e que provocou toda essa reflexão, estava agora na frigideira pronto para ser comido pelas crianças que saiam de todos os lados. "Viver é eternamente tolerável, viver ocupa e distrai, viver faz rir. Viver é fazer, é fazer rir dos mistérios, o meu mistério é de eu ser apenas um meio, e não um fim, tem-me dado a mais maliciosa das liberdades."

O texto continua dissertando sobre a vida cotidiana, dos trabalhos, das liberdades, da corrupção. E também o tempo que me deram e que nos dão apenas para que no ócio honrado o ovo se faça, pois tenho usado esse tempo para prazeres ilícitos e dores ilícitas, inteiramente esquecidas do ovo (ovo-vida).

Neste parágrafo estão registradas as reclamações de alguém que representa toda a humanidade, e diz: "ou é isso mesmo que eles querem que me aconteça. Exatamente para que o ovo se cumpra? Liberdade ou estou sendo mandada? Minha revolta é que para eles eu não sou nada, sou apenas preciosa. Com o dinheiro que me dão ando ultimamente bebendo. Nem meu espelho reflete mais um rosto que seja meu. Ou sou agente ou traição mesmo."

O texto termina com a resignação do narrador. Aceita tudo que lhe é cobrado. Dorme o sono dos justos por saber que sua vida fútil não atrapalha a marcha dos tempos ela sabe que a querem ocupada e distraída. Lamentação continua: "eles me querem como instrumentos do trabalho deles, de qualquer modo era só instrumento que eu poderia ser, pois o trabalho não poderia ser mesmo meu." O texto termina como começou, com o ovo:

"por devoção ao ovo, eu o esqueci. Meu interesseiro esquecimento. Pois o ovo é um equívoco.
Diante de minha adoração possessiva ele poderia retrair-se e nunca mais voltar. Mas se ele for esquecido. Mas se eu fizer apenas o sacrifício de viver apenas a minha vida e de esquecê-lo. Se o ovo for impossível.
Então, livre, delicado, sem mensagem alguma para mim talvez uma vez ainda ele se locomova do espaço até essa janela que desde sempre deixei aberta. E de madrugada baixe do nosso edifício. Sereno até a cozinha. Iluminado-a de minha palidez."

O Ovo e a Galinha de Clarice Lispector









Leitura poética do conto "O Ovo e a Galinha", de Clarice Lispector.

Entrevista Clarice Lispector - Parte 1




Entrevista Clarice Lispector - Parte 2




Entrevista Clarice Lispector - Parte 3
http://www.youtube.com/watch?v=ZVwj3pHAi_s&feature=related


Entrevista Clarice Lispector - Parte 4
http://www.youtube.com/watch?v=ptCJzf20rbY&feature=related



Perto do Coração Selvagem - Clarice Lispector

Felicidade Clandestina

Felicidade Clandestina

Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade". Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria. Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança da alegria: eu nao vivia, eu nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam. No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez. Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono de livraria era tranqüilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte"com ela ia se repetir com meu coração batendo. E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra. Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. As vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados. Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler! E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo...


Clarice Lispector

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João de Deus







Não há existência alguma
Que não tenha amor! Nenhuma;
Porque o amor é, em suma,
Essência de todo o ser.
Há sempre quem nos atraia:
Mil vezes que a onda caia
Há uma rocha, uma praia
Aonde a onda vai ter.

João de Deus (1830-1896)

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Tecnologia para a vida ou a vida para a tecnologia






"Aprende com o passado, não chegues ao fim da vida só para descobrires que não chegaste a viver.
A pessoa que nada arrisca, nunca saberá o que é a alegria e a desilusão."


Elbert Hubbard (1856-1915)